sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Mentiras,Racismo e Crise

Não há «critério jornalístico» que explique como, depois de 5 anos a propalar a tese de que o assassinato de ex-primeiro-ministro libanês, Rafiq Hariri, era obra dos serviços secretos sírios, não se noticie hoje com igual entusiasmo que essa monumental cabala (que deu direito à criação de um «Tribunal Internacional» específico, ainda em funções) está a ruir como um castelo de cartas. É preciso um esforço grande para descobrir a notícia de que o próprio filho e actual primeiro-ministro libanês, Saad Hariri, e forças políticas que o apoiam, reconhecem hoje que a «pista síria» era falsa e a investigação foi politicamente inquinada (Asia Times, 10.9.10). É preciso um esforço grande para descobrir as notícias de que ao longo destes últimos meses, numerosas redes de espionagem israelitas, envolvendo gente altamente posicionada nas estruturas de poder no Líbano, foram desmanteladas (France24, 3.9.10), o que indicia explicações alternativas e bem mais convincentes para o crime de 14 de Fevereiro de 2005, um ano antes da invasão israelita do Líbano.

Não há «critério jornalístico» que explique como a sempre entusiástica promoção da tese de que a guerrilha colombiana tem responsabilidades em massacres ou no narcotráfico, conviva com um ensurdecedor silêncio quando se trata de noticiar a descoberta duma vala comum com mais de 2000 cadáveres (quase tantos quantos os mortos do 11 de Setembro) às portas da base militar colombiana de La Marcarena. Nem mesmo o reconhecimento pelas próprias forças armadas colombianas da sua responsabilidade pela vala comum (Counterpunch, 1.4.10) ou a visita de numerosos euro-parlamentares que reconhecem tratar-se de vítimas civis de massacres oficialistas (La Jornada, 24.7.10), merece destaque noticioso. Nem o facto do recém-eleito presidente colombiano, Juan Manuel Santos, ser na altura ministro da Defesa, com responsabilidade directa pelas acções das forças armadas, manchou as campanhas de louvor à «exemplar democracia» genocida e narcotraficante da oligarquia colombiana.

Nada disto surpreende. A comunicação social de massas não informa. Esconde ou cria a «realidade», consoante os desejos dos seus patrões e dos interesses de classe que representa. Mas é por isso que devemos registar a cada vez menos subtil campanha mediática de promoção do racismo. Dirão alguns que são loucos marginais. Mas são loucos marginais com promoção mediática por parte de sectores das classes dominantes. Na concentração racista de 11 de Setembro em Nova Iorque discursou Geert Wilders, o chefe do terceiro maior partido na «tolerante» Holanda (15,4% dos votos em Junho passado). Também discursou o ex-embaixador dos EUA na ONU, e émulo do Dr. Estranhamor, John Bolton (BBC, 11.9.10). O (então) dirigente do Banco Central alemão e membro do SPD, Thilo Sarrazin, publicou há dias um livro a dar mais um passo na «legitimação» do racismo. No respeitável Der Spiegel (10.9.10) é possível ler colunistas a dar-lhe a mão. Na Europa, da Itália de Berlusconi à França de Sarkozy, da Holanda à Bélgica, da Alemanha ao Reino Unido, e no mediático Portugal do «arrastão», é cada vez mais frequente ouvir insinuar que a culpa de tudo é dos imigrantes, dos muçulmanos, ou dalgum outro bode expiatório. Há 80 anos, no auge da outra grande crise mundial do capitalismo, a conversa era igual, embora os alvos fossem os judeus e a «conspiração judaico-bolchevique». O racismo serviu de caldo de cultura para lançar a mais violenta e brutal resposta do capitalismo à sua crise – o nazi-fascismo e a guerra.

Ontem como hoje, o racismo serve para desviar a atenção dos verdadeiros responsáveis da crise. Serve para que o descontentamento de largas camadas sociais, que estão a ser arruinadas pela crise, não se dirija contra os responsáveis por essa crise (que são também os donos da comunicação social que vai alimentando o monstro) mas contra bodes expiatórios de ocasião. Serve para abrir caminho à repressão e à criminalização da resistência. Serve para promover uma exploração ainda mais intensa e a guerra.

In "Avante!" por Jorge Cadima

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Campanha Nacional do PCP em defesa da produção nacional e do aparelho produtivo

O PCP anunciou a realização nos próximos meses de uma Campanha Nacional em defesa da produção nacional sob o lema – Portugal a produzir, destinada a afirmar o valor estratégico da produção nacional e a aproveitar as potencialidades do país, para a criação de emprego, o combate à dependência externa e a afirmação de uma via soberana de desenvolvimento.

1 - O país está confrontado com uma das mais graves crises das últimas décadas. A persistência numa política vinculada aos interesses dos grupos económicos e financeiros, de abdicação dos interesses nacionais, de desaproveitamento dos seus recursos e potencialidades está, não só na origem dos gravíssimos problemas que o país enfrenta – estagnação e recessão económica, aumento da dívida externa e da dependência, desemprego e défices estruturais (alimentar; energético; industrial; tecnológico) – como é um factor de agravamento da actual situação e de condicionamento do futuro do país.

O contexto de aprofundamento da crise do capitalismo, que é também a crise dos princípios e orientações e práticas dos responsáveis por mais de 30 anos de política de direita, pôs em evidência as consequências de uma política de constante ataque aos direitos dos trabalhadores e contrária aos interesses nacionais. Uma política que, liquidando importantes conquistas de Abril e em confronto com a Constituição da República, constitui um crime premeditado contra os interesses fundamentais do país e do povo português. Uma política que ao serviço do grande capital e voluntariamente submetida a ditames da União Europeia – cuja natureza e orientações colide com os interesses nacionais - conduziu ao agravamento da exploração dos trabalhadores, a assinaláveis quebras na produção nacional, ao desmantelamento e liquidação de importantes sectores industriais, à sempre crescente substituição da produção nacional por importações, a um desprezo pelos problemas da economia real em favor das actividades financeiras especulativas.

Portugal não é um país pobre. O país, os trabalhadores e o Povo português, não aguentam mais esta política de desastre nacional. A defesa da produção e do aparelho produtivo nacional emergem como uma incontornável resposta ao actual processo de declínio económico e que é inseparável da melhoria das condições de vida da população, do aumento dos salários e pensões, do alargamento dos direitos dos trabalhadores, do combate à precariedade e ao desemprego.

É neste quadro que o PCP irá realizar nos próximos meses uma campanha em defesa da produção nacional sob o lema – Portugal a produzir. Uma importante iniciativa política, destinada a afirmar o valor estratégico da produção nacional para o aproveitamento de todas as potencialidades e recursos do país, para a criação de emprego, para o combate à dependência externa, para a afirmação de uma via soberana de desenvolvimento.

2 - A pretexto do «défice» e agora da «dívida externa» tem-se desenvolvido uma autêntica chantagem sobre os trabalhadores e o Povo português destinada a reduzir o valor dos salários, encerrar e privatizar serviços, agravar a exploração.

Como o PCP há muito vem alertando, o problema central do país não é o défice público ou a dívida pública como PS, PSD e CDS querem fazer crer, mas sim a dívida externa global (pública e privada) em consequência de um processo de desindustrialização, de degradação e do abandono do aparelho produtivo, das privatizações, do domínio do capital estrangeiro sobre a economia nacional e de uma política monetária e cambial conduzida pelo Banco Central Europeu, altamente penalizante das nossas exportações e actividades produtivas.

Contrariando o discurso dominante, mentiras e mistificações que durante anos foram lançadas para justificar o abandono da produção nacional, o PCP sempre afirmou que não só era possível como absolutamente necessário investir na produção e no aparelho produtivo, como condição para a defesa da nossa soberania, para a criação de emprego e o desenvolvimento do país.

3 - O PCP propõe a adopção de uma política de Estado em defesa e promoção da produção nacional que contribua para concretizar um modelo de substituição de importações por produção nacional, promova um programa de industrialização do país, aproveite e potencie todos os recursos nacionais, tenha como objectivo garantir a soberania alimentar, o pleno emprego e o emprego com direitos, aposte prioritariamente na dinamização do mercado interno sem desguarnecer as exportações num quadro de alargamento e diversificação de relações externas e que tenha como eixos essenciais:

- Reforço do investimento público voltado para a indústria, a agricultura e as pescas, com a criação e recuperação de infra-estruturas necessárias à produção, à rede de transportes e logística, e a criação de novas empresas e áreas de intervenção públicas;

- Aproveitamento integrado de todos os recursos nacionais com uma política que, concretizando medidas de combate ao desemprego, ao trabalho precário, à desvalorização dos salários, potencie o aproveitamento do mais importante recurso nacional – a capacidade criativa e produtiva de milhões de trabalhadores e, simultâneamente, promova os importantes recursos naturais do subsolo e energéticos, agrícolas e florestais, os recursos decorrentes do mar assim como de toda capacidade produtiva ainda instalada no nosso país – designadamente no plano industrial –, potenciando-a e impedindo a sua liquidação.

- Defesa e reconstituição de um forte e dinâmico Sector Empresarial do Estado, recuperando para o sector público – por via de nacionalização ou negociação adequada – sectores básicos e estratégicos da nossa economia designadamente na banca, na energia, nas telecomunicações e transportes. E dinamizando sectores estratégicos para a vida económica do país que estão hoje ou profundamente fragilizados ou sujeitos a lógicas financeiras de curto prazo, nas mãos de capital nacional e/ou estrangeiro, ou mesmo abandonados;

- Planeamento económico, tal como a Constituição da República prevê e sem o qual não será possível reestruturar o tecido económico do país. Planeamento onde se realize uma avaliação dos recursos humanos, dos meios de produção necessários, dos recursos tecnológicos, da componente importada e dos recursos financeiros necessários a uma política de Estado na defesa e promoção da produção nacional.

4 – A concretização de uma política de Estado em defesa e promoção da produção nacional, pressupõe um conjunto de medidas concretas dirigidas a cada um dos sectores da actividade económica.

A Indústria transformadora é a base insubstituível do crescimento económico e do desenvolvimento. No quadro de actual processo de desindustrialização, foram desmanteladas, ou diminuídas nas suas capacidades produtivas, importantes unidades industriais, que seriam imprescindíveis para responder aos principais défices do país. Integrados num plano de industrialização do país que o PCP propõe, onde o Estado assuma um papel determinante impõe-se o desenvolvimento das indústrias siderúrgicas, metalomecânicas, electromecânicas, eléctricas, química pesada, reparação e construção naval e de alta tecnologia assim como da indústria extractiva, dotando o país de alavancas fundamentais para o relançamento industrial do país.

No âmbito de uma outra política para a agricultura e o mundo rural, a defesa da Agricultura e da Floresta deve constituir uma prioridade das políticas públicas que permita combater o défice agro-alimentar (na ordem dos 4 mil milhões de euros por ano), criar emprego, dinamizar as economias locais e rurais.

A situação actual reclama medidas urgentes no apoio à produção e ao rendimento dos agricultores, na concretização de importantes obras públicas e no integral aproveitamento de outras como o Alqueva, na concretização de um Plano Nacional de (re)Florestação, medida que tenham também como objectivo a concretização de uma nova Reforma agrária nos campos do sul com a liquidação da propriedade latifundiária e a racionalização fundiária pelo livre associativismo no Norte e Centro do país, respondendo assim às questões do emprego, da soberania e segurança alimentar do país.

No política de pescas contrariando a tendência de persistente e dramática redução de efectivos e embarcações impõe-se um incremento efectivo do pescado capturado e descarregado, a concretização de investimentos e unidades industriais públicas ligadas à exploração, investigação e desenvolvimento da aquacultura e das conservas e o efectivo aumento e renovação das nossas diferentes frotas de pesca – longínqua, costeira e artesanal – associadas ao reforço da iniciativa do Estado português (seja no plano da UE seja nas relações bilaterais) que assegure o desenvolvimento deste sector.

5 - Na situação desastrosa em que se encontra a economia nacional, perante os dramáticos problemas sociais, o desemprego, a precariedade e os baixos salários, a resposta não pode ser a da continuação da política de direita, mas a de uma ruptura com o actual rumo, de uma mudança na vida nacional que imponha uma política patriótica e de esquerda.

A campanha que o PCP irá realizar durante os próximos meses sob o lema – Portugal a produzir - destina-se a permitir uma mais larga tomada de consciência de que este velho e arrastado caminho para o desastre e o declínio das actividades produtivas nacionais tem de ser urgentemente travado e que, numa perspectiva sólida de desenvolvimento económico e progresso social, e mesmo a solução dos actuais problemas financeiros, só será possível com uma nova política de apoio, revitalização e modernização do aparelho e do tecido produtivos nacionais, nas mais variadas áreas e sectores.

“Portugal a produzir” será uma campanha que, apresentando propostas e soluções, irá ao encontro de trabalhadores, pequenos produtores, PME's, de instituições e empresas, ouvindo os seus problemas e aspirações.

Uma campanha que terá início na Festa do “Avante!” com a apresentação de uma importante exposição no Pavilhão Central com o mesmo lema e que terá durante os próximos seis meses um plano de acção visando dar expressão pública e institucional a um programa de medidas que, seja do ponto de vista sectorial, seja do ponto de vista local ou regional, dinamizem o aparelho produtivo e afirmem um outro rumo para o país.

Uma campanha que falará dos problemas concretos da vida nacional, longe das insignificantes querelas com que PS, PSD e CDS, procuram iludir a actual situação, mas próxima do país profundo, da realidade concreta com que estamos confrontados.

“Portugal a produzir” é assim a definição de um rumo inverso ao da política de direita que, correspondendo às legítimas aspirações dos trabalhadores e do Povo português a uma vida melhor, se afirma como uma grande proposta do PCP para o presente e o futuro de Portugal.