sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

"SONHO E LUTA"



Quando se chega ao fim de um ano tão complicado como foi o ano de 2007, mais do que fazer o balanço, apetece colocar em cima da mesa todas as esperanças possíveis, seguindo o poeta António Gedeão, porque o sonho comanda a vida.É essa esperança que transforma em luta a indignação que sentimos pelas injustiças que persistem, resultado de políticas neoliberais que mantêm uma exploração sem limites dos que menos têm, que multiplicaram o trabalho precário e mal pago porque o desemprego continua a crescer, que admitem lucros fabulosos do sector financeiro e fecham os olhos a escândalos, como o do BCP, enquanto milhares de famílias trabalhadoras e de muitos micro e pequenos empresários vivem a angústia do pagamento de juros elevados dos empréstimos que tiveram de contrair e agora mal sabem como pagar.É essa esperança que permite encarar o próximo ano de 2008 como um tempo onde muitas mudanças são possíveis, resultado das pequenas e grandes lutas que vamos ter pela frente, e que nem em vésperas de Natal pararam, porque as pessoas não se conformam com o encerramento de serviços públicos essenciais, porque querem que se mantenha o serviço de saúde e que o atendimento permanente não fuja para quilómetros de distância que podem determinar a vida, ou a morte, de quem não tem carro nem dinheiro para a clínica privada.Foi esse sonho que comandou a vida de todos os que lutaram para que fosse possível uma revolução em Portugal, a revolução que transformou os sonhos na realidade de um serviço nacional de saúde gratuito para todos, que garantiu emprego com direitos, salários dignos, segurança social pública e universal e impediu despedimentos sem justa causa. É essa realidade que ainda temos consagrada na Constituição da República Portuguesa, herança de Abril de 1974, mas que as elites do poder económico e financeiro querem pôr em causa usando a integração europeia para mais facilmente conseguirem impor os seus objectivos.Vamos ter pela frente a luta contra a retoma do essencial da dita «constituição europeia», no que agora chamam «tratado de Lisboa», mas que, para entrar em vigor, ainda precisa de ser ratificado pelos 27 Estados que são membros da União Europeia. Ou, mais precisamente por 26, dado que a Hungria já o fez no seu parlamento nacional. Em Portugal, ainda não se sabe se o PS mantém a promessa do referendo ao Tratado. Certo, é que o PCP já entregou na Assembleia da República uma proposta de pergunta para o referendo, dando assim um passo essencial para que o referendo se faça.A exigência de um referendo ao Tratado, após um amplo debate público pluralista, é, neste momento, uma das lutas principais. Impõe-se que as pessoas conheçam o que está em causa neste Tratado, e que tem implicações em toda a sua vida futura. A diluição do poder soberano dos portugueses que este Tratado prevê, incluindo a Carta dos Direitos Fundamentais aí inserida, visa pôr em causa direitos soberanos consagrados na Constituição da República Portuguesa e dificultar ainda mais a sua concretização, seja na área das funções sociais do Estado, seja de decisões sobre a utilização do nosso território, incluindo os recursos marinhos, seja dos direitos, liberdades e garantias cada vez mais dependentes dos órgãos de poder da União Europeia, seja da política externa e de defesa.As grandes potências europeias e as elites do poder político e financeiro em Portugal querem reforçar a sua capacidade de intervenção para aplicar a liberal Estratégia de Lisboa, incluindo a «flexigurança» que lhes permite recuperar alguns aspectos do que tinham perdido com a famigerada directiva Bolkestein, e que, em Portugal, avança nas alterações que querem fazer ao Código Laboral, para fragilizar ainda mais a contratação colectiva, aumentar a precariedade do trabalho, pôr em causa direitos duramente conquistados ao longo de cem anos de lutas dos trabalhadores.Mas não vão ter um caminho fácil. As lutas dos trabalhadores e dos povos vão opor-se a estas políticas neoliberais, a esta intensificação da exploração. Em Portugal, na França, na Alemanha e em outros lados.Não será uma luta fácil. Mas é uma luta essencial para travar a exploração capitalista e sonhar com um mundo mais justo, sem exploração. E sempre «que o homem sonha o mundo pula e avança como bola colorida nas mãos de uma criança».BOM ANO DE 2008,COM MUITOS SONHOS E LUTAS!

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

P'ro ano é que é



Apesar da aproximação do Natal e dos resultados que aí estão, não é do futebol da segunda circular que aqui se trata, mas sim da anunciada intenção do PSD de - até que enfim(!) - fazer de 2008 «ano da demarcação clara do Governo de José Sócrates».A prometida «radicalidade» de oposição ao Governo PS e a anunciada «combatividade» face ao «cinzentismo» de Marques Mendes, que há três meses levou L. Filipe Menezes ao poder no PSD, resultou afinal em calmaria, só entrecortada pelos Flops do Lopes no parlamento e pelas escassas diatribes de Menezes sobre a concessão dos canais da televisão digital terrestre aos grupos Impresa e Prisa - que é essencial garantir apoios no complexo empresarial mediático.Para além disto Menezes cuidou da «imagem de Estado», ditada pelos assessores de marketing político e consonante com Cavaco, por interposta M. Ferreira Leite – do que se trata é de espremer o PS e de levar o mais longe possível as suas políticas de direita, que o PSD não teria condições de concretizar. Do que se trata é de «agilizar acordos negociais» com o Governo PS «muito mais rapidamente que M. Mendes», na justiça, na segurança interna, nas leis eleitorais, nas obras públicas, etc., - mas sem nunca lhes chamar «pactos de regime», para não parecer que está tudo cada vez mais na mesma.Porque a questão - a perplexidade deste PSD -, é que nada tem de facto de substancial a contrapor à política do PS/Sócrates, ou a propor aos grandes interesses, que este Governo não esteja a fazer - com prejuízos profundos para os trabalhadores, o povo e o país.A crise do PSD (e do CDS), que é mais evidente desde 2005 e que continua a agravar-se, resulta de estarem exauridos pelo PS, que assume o seu ideário de perversão constitucional e reconfiguração do Estado e as suas políticas de domínio do capital financeiro sobre o poder político e a economia e assim garante a rede clientelar desta esmagadora concentração da riqueza.Bem pode Menezes prometer que para o ano vai esbracejar, porque não terá muito por onde. E como no passado, o PSD ficará à espera que o embate da luta popular e o fracasso das políticas do PS lhe entreguem o poder.Também por isso urge o reforço do PCP, por uma nova política, contra este rotativismo absurdo.

sábado, 15 de dezembro de 2007

DEMOCRACIA ?



Em Lisboa, no passado dia 13 foi assinada uma proposta de tratado que teve como objectivo (não é demais denunciá-lo), recuperar o conteúdo da rejeitada «constituição europeia». Um autêntico embuste político que já obrigou a (re)apresentar esta proposta de tratado, que no início foi «constitucional», embrulhado sob a capa de «mini», de «simplificado», de «reformador», para agora, e segundo alguns, passar a ser designado de «Lisboa».Depois de Março, de Junho e de Outubro, concretizou-se assim mais um acto da encenação meticulosamente preparado para iludir os povos, nomeadamente o povo português, quanto a uma intenção e propósitos que desrespeitam profundamente a democracia.Uma encenação à «americana» com que o Governo do PS procurou dissimular a sua política de direita e as consequências desta para a esmagadora maioria dos portugueses. Isto é, uma encenação com que o Governo PS procurou iludir a sua política de classe, de concentração da riqueza e da promoção do poder dos grandes grupos económico-financeiros no País. Uma encenação que intentou fazer esquecer a realidade da exploração, da precariedade laboral, do desemprego, dos baixos salários e pensões, da pobreza de milhões de portugueses, da longa e premeditada degradação dos serviços públicos, do desrespeito dos mais elementares direitos dos trabalhadores e suas organizações representativas, do cercear do pleno e livre exercício da vida democrática nas vertentes política, económica, social e cultural.

Para lá da encenação...

Muito se esforçam os arautos da proposta de tratado da União Europeia para convencer de que o que é não é. A sua dificuldade é que o seu discurso é desmentido, seja pelas políticas de direita realizadas a nível nacional e promovidas ao nível da UE, seja pelas suas consequências, como a degradação das condições de vida de milhões de portugueses, seja pelo que efectivamente a proposta de tratado consigna. Isto é, desmentido pela realidade!Por exemplo, muito se têm esforçado, multiplicando declarações, para apresentar a proposta de tratado como democrática, realçando o reforço do papel do parlamento europeu e alegadamente dos próprios parlamentos nacionais.Trata-se de uma autêntica mistificação que procura escamotear que o que acontece é precisamente o contrário.Os parlamentos nacionais perdem muito mais do que aparentemente ganhariam. Se não vejamos: ao serem «comunitarizadas» mais políticas, são transferidas competências das instituições democráticas dos Estados para as instituições supranacionais da UE. Deste modo, os parlamentos nacionais perdem competências em vários domínios, ficando em troca apenas com a possibilidade de acompanhar, sem que nenhum deles isoladamente possa vetar as iniciativas apresentadas pela Comissão Europeia.Com a ampliação determinada neste tratado das decisões por maioria qualificada (o que significa o fim da unanimidade, isto é, da possibilidade de um Estado evitar que lhe imponham uma decisão contrária aos seus interesses) e por co-decisão (onde o Parlamento Europeu participa, a par do Conselho, na adopção das decisões), as instituições supranacionais da UE reforçam os seus poderes, mas de tal forma que só as grandes potências da UE - com destaque para a Alemanha -, asseguram e até reforçam a capacidade de defender os seus interesses, ao contrário, por exemplo, de Portugal.Portugal perde deputados no Parlamento Europeu (quando outros os aumentam) e perde influência no processo de decisão do Conselho (quando outros o reforçam).Pelo contrário, com este tratado, as grandes potências fortalecem o seu domínio do processo de decisão da UE. No Conselho, uma decisão seria tomada a partir de uma maioria dupla de 55% dos Estados que representem 65% da «população», ora os seis «grandes» têm cerca de 70% do "peso populacional", Portugal cerca de 2,4%. No Parlamento Europeu os seis «grandes» dominariam com os seus 60% de deputados, Portugal teria 2,9%. Que «rica» democracia esta...Com este tratado Portugal perde soberania. Isto é, o povo português perde capacidade de decisão quanto a questões essenciais para o seu presente e futuro ao transpor competências, que devem ser exercidas pelas suas instituições democráticas, para instituições supranacionais da União Europeia, nas quais Portugal vê reduzidas quase a nada as possibilidades de defender os seus legítimos interesses.Então, como é possível que se tente passar a ideia de que o tratado reforça a democracia? Poderá lá haver democracia sem que o povo português tenha a capacidade de decidir sobre as políticas que têm profundas implicações para o País? Poderá lá haver democracia sem a salvaguarda da soberania nacional?

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

RESIGNADA CONFISSÃO


A admissão por parte de Cavaco Silva da ausência de solução para alguns dos municípios do interior – testemunhada pela elucidativa expressão: «quando se ultrapassa uma certa linha é difícil fazer a inversão» – é simultaneamente uma confissão de abandono do objectivo de construção de um país coeso e desenvolvido e um libelo acusatório às políticas de direita. E, sobretudo, a admissão de um inaceitável conformismo com a desertificação e o abandono de uma significativa parte do território nacional.É nas políticas de direita, de que foi parte activa e que hoje cauciona e aplaude no desempenho do governo do PS, que radica parte significativa dos problemas do interior do país. É no limbo da denominada «convergência estratégica», programa de acção comum para garantir a co-habitação dos projectos e objectivos de direita, que medra há muito a assumida política de abandono do interior. As dificuldades destas regiões não são separáveis das que, em resultado da falta de investimento público e de abandono do produção nacional, comprometem o desenvolvimento nacional. Mas sobre elas recai uma deliberada política de desprezo sobre quem nelas vive e procura futuro. Mais do que resignadas lamúrias o que há a observar são as razões que as justificam e as agravam: uma estratégia de encerramento de serviços públicos de escolas e unidades de saúde; a ausência de investimento público; uma lei de finanças locais destinada a comprometer e inviabilizar dezenas de municípios do interior; uma política fiscal penalizante; uma assumida opção por um modelo de país litoralizado.O interior do país, a exemplo das dificuldades gerais do país, é em si uma acusação às políticas de direita passadas e presentes. Foi essa política que, como se sublinhou na conferência nacional do PCP, «conduziu o país ao declínio, à estagnação económica, ao retrocesso social e ao avolumar das injustiças». O direito a um futuro digno e de progresso das populações do interior dá mais actualidade à exigência de um outro rumo e de uma outra política.